sábado, 28 de junho de 2008

Gravando: O Documentário, o anti-documentário e o anti-anti-documentário

Eu sempre fui da teoria de que se um artista consegue explicar muito bem o seu trabalho, ele (o trabalho ou o artista) é, no mínimo, suspeito. Os moderninhos defensores da Teoria da Racionalização que me perdoem, mas o que realmente fica de todo trabalho criativo é o fundo do pântano, o lado avesso da roupa, o detrás dos muros, o espaço entre o gaguejar e a fingida manifestação de segurança. O resto é ciência.

É evidente que digo isso para justificar minha incapacidade de ser mais claro, mas serve como introdução para uma boa conversa.

Hoje o documentário brasileiro atravessa uma fase de maturidade (ou maturização). No meio de um processo de quase "estudo" da linguagem documental, temos vislumbrado uma safra muito boa e contínua de documentários que se discutem e rediscutem, tentando abrir novas janelas para esse meio de comunicação que vinha se demonstrando um pouco engessado até então. Só que essas recentes viagens nesse mundo da linguagem documental tem gerado uma aberração, provavelmente criada pelos teóricos do processo criativo, que, meio que disfarçadamente, tenta delimitar e definir como será essa nova cara do documentário no Brasil (Vide regulamento do DOC-TV).

Assim, surgem vertentes como o anti-entrevistismo, a imagem falando por si, o som falando pela imagem, o não-dizer , que, apesar de funcionarem muito bem em vários momentos, não podem, de maneira alguma, adquirirem jurisprudência de lei.

Antes de começarmos os trabalhos no nosso documentário, discutimos bastante esse tipo de coisa, meio que assustados, primeiro pelo fato de que qualquer processo criativo acaba passando por essa espécie de limbo antes de adquirir uma cara própria. Depois porque sentíamos que pela própria personalidade do Fernando, que gosta de falar e fala bem, seria muito difícil escaparmos de fazer entrevistas. Muitas entrevistas.

O Duke já havia antecipado que não queria fazer um documentário experimental (eu já falei que estamos dirigindo juntos o documentário, não falei?). Agora, como mergulhar fundo no "processo do processo criativo" e na sua importância para a vida, sendo burocrático, catedrático e tradicional?

Como já havíamos definido que começaríamos o documentário mesmo sem ele ser aprovado na lei de incentivo, e tínhamos já a data de início marcada quando soubemos que fomos aprovados, decidimos abraçar a teoria da bóia e mergulhamos na corredeira sem saber onde íamos parar.

Hoje, depois de mais ou menos umas 30 entrevistas e quase chegando ao final das filmagens, estamos descobrindo (ou apenas confirmando um sentimento prévio) que toda essa teorização nada mais é do que ela sempre pareceu ser: pura e catedrática teoria.

Ser tradicional até o extremo e romper os limites do extremo da tradicionalidade é atualmente a nossa meta. É claro que se ninguém ouvir falar mais desse documentário poderá concluir, sem medo de errar, que nós descobrimos, ao mergulhar no fundo do mar, que debaixo da superfície
da água o que tem mesmo é agua. Mas de que adianta a possibilidade de mergulhar se já sabemos antecipadamente tudo o que vamos encontrar lá?

E dia 13 de janeiro, embalado por uma ressaca de minha festa de aniversário no dia anterior, começamos finalmente a gravar.

Carlos Canela




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